O Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público de Contas do Estado do Amazonas (MPC/AM) e a Superintendência da Polícia Federal no Amazonas (SR/PF/AM) expediram recomendação com o objetivo de cancelar licenças ambientais e autorizações para extração de madeira a partir de planos de manejo com fraude aparente, concedidas a empresas investigadas na Operação Arquimedes por desmatamento ilegal na Amazônia.
Baseado em subsídios técnicos e apurações da Polícia Federal do Amazonas, o documento foi encaminhado ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ao Serviço Florestal Brasileiro e a órgãos federais e estaduais fundiários.
O MPF, o MPC/AM e a PF também preconizam que, por cautela necessária, sejam bloqueados o acesso e os créditos obtidos pelas madeireiras no sistema de Documento de Origem Florestal (DOF), principal instrumento de controle do fluxo de produtos e subprodutos florestais de origem nativa no Brasil. A recomendação também pede instauração imediata de processos administrativos sancionadores e anulatórios contra as empresas envolvidas para investigar possíveis infrações administrativas ambientais e atos de corrupção contra a Administração Pública.
Outra medida recomendada é a intensificação da presença do Ipaam em campo para fortalecer tanto as operações de repressão estratégica aos ilícitos como o monitoramento das explorações que o órgão licencia.
De acordo com o MPF, o MPC/AM e a PF, devem ser representados ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) os casos de desvio de conduta dos profissionais responsáveis e de falsidade de informações sobre planos de manejo, inseridas no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), gerenciado pelo Ibama.
Também foi recomendada a proposta de revisão de atos regulamentares ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (Cemaam) sobre o devido processo de avaliação técnica, autorizações prévias, planos de manejo florestal sustentável (PMFS), licenças, planos operacionais de exploração (POE) e autorizações de exploração (Autex), no sentido de contemplar requisitos e instrumentos de controle de rigor técnico, de transparência, de integridade interna, de padronização de análise e de relatórios, de atualidade científica, tecnológica e de fidedignidade das informações, para garantia de legalidade do empreendimento contra as fraudes verificadas.
A recomendação ainda requer a adoção imediata de uma série de medidas de combate a infrações ambientais, em nível estadual, nos processos de exploração florestal, entre elas a expedição e transparência de relatórios gerenciais que permitam aos órgãos de controle e à sociedade a avaliação da veracidade das informações prestadas pelos manejadores e seus responsáveis técnicos; e a exigência, por ato normativo do Ipaam, de instalação de rastreadores e GPS Tracker nos veículos de transporte de madeiras.
O prazo para que sejam informadas as medidas adotadas para o cumprimento da recomendação é de dez dias.
Concessão irregular de licenças – De acordo com a recomendação do MPF, do MPC/AM e da PF, o Ipaam tem concedido licenças ambientais para atividade madeireira dentro de áreas federais, “usurpando a competência que o arcabouço jurídico brasileiro reservou ao Ibama”.
O Código Florestal estabelece, no art. 31, parágrafo 7º, que a aprovação do PMFS em florestas públicas de domínio da União é do órgão federal de meio ambiente. A aprovação pela União do manejo e da supressão de vegetação em terras devolutas federais também é prevista pela Lei Complementar 140/2011.
A apuração dos órgãos ministeriais aponta que de 11.423 planos de manejo registrados pelo Ipaam, 5.763 afetam áreas de interesse federal, como assentamentos, glebas federais, terras indígenas, áreas quilombolas, unidades de conservação federais e sítios arqueológicos georreferenciados.
“As várias operações já realizadas pelo MPF, Polícia Federal e Ibama que demonstram a costumeira prática de fraude em planos de manejo que possibilitam a legalização de madeira explorada ilegalmente”, afirma trecho da recomendação. Laudos periciais produzidos pelas equipes de investigação e Setor Técnico Científico da Polícia Federal, resultado da análise das centenas de processos de planos de manejo florestal e outros documentos apreendidos na Operação Arquimedes, detalham as irregularidades identificadas.
Na recomendação, o MPF, a PF e o MPC/AM ressaltam ainda que a inscrição do imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural (CAR) é um requisito para a supressão vegetal em florestas, conforme o Código Florestal (art. 12, parágrafo 3º). Para a inscrição no CAR, é necessária a comprovação da propriedade ou posse do imóvel. Por essa razão, “é lícito afirmar que não é possível o licenciamento ambiental de PMFS sem a prévia comprovação da propriedade ou posse do imóvel rural”.
“A questão fundiária deve ser entendida como uma verdadeira prejudicial à questão ambiental, pois não é possível considerar preenchidos os requisitos para a aprovação do PMFS (inclusive, e principalmente, a prova de regular posse do imóvel rural onde se desenvolverá a atividade de exploração florestal) quando o interessado recorre a um documento fundiário emitido por órgão estadual e o imóvel rural pertence à União”, destaca o documento.
Operação Arquimedes – A Operação Arquimedes foi iniciada a partir de alerta emitido pela Receita Federal e pelo Ibama, em 2017, ao verificar aumento incomum do trânsito de madeira pelo Porto Chibatão. A administração do porto informou que a única fiscalização que estava sendo realizada nos contêineres que ali transitavam era a análise de notas fiscais, embora houvesse ciência de que carregamentos de madeira devem estar sempre acompanhados do Documento de Origem Florestal (DOF), a ser mantido e averiguado por todos aqueles que transportam, guardam ou servem como depositários de cargas de madeira.
Nas duas fases já realizadas até o momento, a operação resultou na apreensão de milhares de metros cúbicos de madeira ilegal de mais de 60 empresas em portos de Manaus e no cumprimento de mandados de prisão temporária e preventiva de dezenas de pessoas.
Texto: Assessoria do MPF